Acessar o arquivo Guia Alimentar Guarani.pdf (3Mb)
Esse guia foi elaborado pelos “pesquisadores cidadãos”, bolsistas do CNPq pertencentes à Tekoa Jejy-ty. Foram dois anos de troca de experiências com estudantes e professores Juruá para que se conseguisse registrar a sabedoria Guarani neste Guia, o qual reflete também os princípios nutricionais do Guia alimentar brasileiro.
A Tekoa Jejy-ty como outras aldeias da região do Vale do Ribeira vive do artesanato que produz e vem lutando para produzir alimentos nas terras onde estão. Essa terra indígena é reconhecida pela Funai, mas não foi demarcada. Há muitas restrições para produzir nessas terras, especialmente há pouca mobilidade para que se mantenha a tradição de rotação das culturas, porque isso envolve maior extensão de terras. Frente a essas condições, faltam políticas públicas de apoio para a produção de alimentos no local. A Tekoa Jejy-ty e outras comunidades da região entendem que sem a demarcação das terras será difícil alcançar a sua segurança alimentar e nutricional.
Na saúde, a unidade de apoio fica há uma hora e meia de carro, a comunidade recebe semanalmente uma rápida visita da equipe que faz o atendimento ao ar livre, tomando como apoio o próprio veículo. A equipe é muito atenciosa e mantém uma boa relação com a comunidade. No entanto, a comunidade deseja uma unidade de saúde e uma maior presença da equipe no local. As ações de prevenção e promoção da saúde são raras. O atendimento hospitalar é feito em Iguape, mas não sem dificuldades. Falta às equipes da cidade o preparo necessário para atender pessoas que não falam o português e obedecem a princípios de outra cultura.
A proximidade com a cidade facilita a venda do artesanato e aos adolescentes frequentarem a escola Juruá, entre outras coisas. No entanto, traz para a aldeia o que existe de precário na cidade, como é o caso da falta de saneamento e água potável. O fato é que existe exclusão e discriminação, com a justificativa de que o território não está demarcado e, portanto, não é permitido ao governo edificar ali, assim, não existe infraestrutura no local. Estando quase dentro da cidade, a entrada de lixo na aldeia é elevada, pois as coisas da cidade precisam de muita embalagem. No entanto, não existe um sistema adequado para a coleta de lixo no local. O Estado tem a responsabilidade pelas estradas vicinais, mas não parece que isso seja válido para as que conduzem até as aldeias. As mulheres, especialmente as mais velhas dominam um grande conhecimento da culinária Guarani, que se de um lado é rica e diversificada, de outro reflete o poder de resiliência desse povo, que na falta do alimento sagrado (Milho), consegue fazer da farinha de trigo o seu principal alimento, tornando o Tipá e o Mbujapé o seu alimento básico. No dia a dia a alimentação tem sido muito monótona e muitas famílias experimentam a insegurança alimentar.
Nas avaliações realizadas, existe a desnutrição infantil, expressa pela baixa estatura de algumas crianças e a obesidade entre os adultos, também há relatos de anemia. Os Juruá, chamam isso de tripla carga da má nutrição. A criança que não cresce direito tem muita chance de ser um adulto obeso, diabético e com pressão alta. A anemia impede o bom desenvolvimento da criança. A comunidade também tem manifestado a preocupação com a depressão. Discriminação social prejudica a saúde mental.
Foi nesse cenário, que este guia foi elaborado, por meio de várias rodas de conversa, com falas importantes do Cacique Leonardo sobre a condição do povo Guarani, as lembranças das mulheres de como em outros tempos era mais fácil o acesso às comidas típicas, a conversa com as aldeias vizinhas e dentro da própria comunidade, buscando onde encontrar essa raridade, o milho Guarani. Obter um pilão, fazer uma fogueira e com as cinzas assar o milho, socar e fazer a farofa para comer com o peixe, pena que ele seja comprado, pois não pode ser pescado nos rios da região. Melhor ainda, se um mês antes se tenha feito uma fenda no coqueiro e aí tenham crescido as larvas que agora podem ser assadas na fogueira e saboreadas com a farofa de milho tostado nas cinzas e socado no pilão. Nada paga essa alegria que é de todos, mas principalmente das mulheres mais velhas.
Assim, este guia tomou como roteiro cada capítulo do Guia alimentar brasileiro, os quais foram ressignificados na cultura e cosmovisão Guarani. Nele, são apresentados os alimentos consumidos pelos Guaranis, pena que nem sempre disponíveis. É mostrada a relação com a cidade e os alimentos que vem da cidade e o quanto isso tem de melhorar. Coloca em evidência a riqueza da cultura alimentar Guarani e o quanto se deve a ela, como forte influenciadora da cultura brasileira.
Autores:
Marinês Borges
Olívia da Silva
Terezinha Molinico
João Batista Ortega
Vilson Borges
Marcelo da Silva
Marcelino Timóteo Verai
Helena Borges
Sabrina Kerexú Mirim Borges
Leonardo da Silva
Facilitadoras:
Bolsistas do Programa Ações Afirmativas, Diversidade e Equidade da UNESP:
Amanda dos Reis Faria
Ana Lívia Marques Chester Silva
Gabriela de Andrade Meira
Marcela Gonçalves de Melo Dias
Viviane Gislaine do Nascimento
Supervisão:
Maria Rita Marques de Oliveira
Fotografia:
João Pimentel de Andrades
Editoração:
Milton Nakata Estúdio
Realização:
Centro de Ciência e Tecnologia para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional da UNESP
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Instituto de Biociências de Botucatu
Apoio Financeiro:
MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Atenção Primária à Saúde Departamento de Promoção da Saúde. Chamada CNPq MS/SAPS/DEPPROS no 28/2020 – Formação em doenças crônicas não transmissíveis e seus fatores de risco associados.